Se me odeia deita na Br.
Junto ao texto, uma foto da artista carioca Aleta Valente deitada no asfalto, no meio da rua. Bem fofa.
Sob um avatar/alter-ego realista no Instagram, @ex_miss_febem se utiliza de um repertório vasto de signos altamente populares. Imagem. É através do poder e da circulação das imagens que a artista desenvolve seu trabalho. Diz: #Sextou e eu vo gastar os meus memes pq dinheiro que é bom nós não tem mesmo.
Uma extrema horizontalidade. Para além de seus trabalhos fora do aplicativo, Aleta realiza, através da capacidade democrática do meio que usa, o contato com o espectador na mais pura intimidade. Talvez, nunca se tenha imaginado a arte tão acessível. Passando o feed, que rola pela tela do celular, o acontecimento artístico possível. Quentin na cama, em pé no busão, cagando, mandando aquele arroz e feijão quente pra dentro, no meio de uma roda de gente chata pra caceta, ou em qualquer situação que o celular esteja à mão. Ela chega aí. Uma arte que está onde você está, é como você é, vem de uma pessoa como você.
Aleta, ali incorpora, junto às suas próprias experiências, a vida de várias mulheres. Usa os estigmas carregados pelo corpo feminino, para apontá-los, escrotizá-los, escrachá-los. Faz a gostosa. Faz a presidiária que dá a luz dentro de uma solitária. Faz a blogayrinha do subúrbio. Faz a carente. Faz a romântica. Nas fotos de casais, as mais zoadas, como adolescente, diz: Como eu queria estar com a pessoa q eu gosto.
Acima de tudo, Aleta expõe as fragilidades do circuito da arte. Artista, mulher, mãe solteira e suburbana, protesta: não há lugar de protagonista para ela. Da Z.O., expõe tudo. Fala do preço da carne, está no point das coxinhas, faz selfie no trem lotado. @ex_miss_febem é o meme da vida real. Enquanto expõe ‘vida real’, rindo (pra não chorar), expõe também: o que é arte? Arte é isso aqui ó.
Na velocidade da notícia, apropria-se do meme. A escrita abreviada, rápida. Na capacidade de rir de si mesmo. Beira o ridículo, no melhor sentido. Assim @ex_miss_febem acaba por se encaixar perfeitamente no papel da amiga que se segue no aplicativo. Ela é a garota do trabalho, a prima, a tia, a irmã. Cabe em qualquer papel, que se encaixe na vida real. Fala de maneira absolutamente compreensível. E a medida que inclui no trabalho artístico, pela linguagem, o absolutamente popular, inclui também neste lugar, seu público.
Em tempos de construção de brasilidade, tropicálias, antropofagias, parangolés, etc; os memes que Aleta compartilha provavelmente entrariam nesta panela. As piadas de Macunaíma rodando pelo Instagram. É uma atualização de brasilidade na arte hoje. Tem a cara, a escrita, a fala, os assuntos. É #obrasilqueeuquero.
CAROLINA LOPES, 32 anos, estuda História da Arte na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Fotógrafa e designer, também trabalhou como bolsista do professor Marcelo Campos na Casa França-Brasil, onde esteve mais perto das práticas curatoriais e artísticas. Nascida e criada em São Gonçalo, teve acesso tardio aos museus, cinemas, e espaços culturais; tendo sido completamente envolvida pelo universo da arte desde o primeiro contato.
Sou eu nessa foto…
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