“Descolonizar o conhecimento significa criar novas configurações de conhecimento e de poder.”
Grada Kilomba
A obra “Conakry” (2016), da artista portuguesa Grada Kilomba, ressalta a necessidade da ocorrência de certas imagens que quando anunciadas podem interferir na realidade de certas perspectivas históricas. A saber, trata-se de imagens recuperadas do processo de independência da Guiné-Bissau que a partir de uma iniciativa do Arquivo de Cinema da Guiné tornaram-se públicas. Em sua produção a artista também escritora e teórica se propõe a uma profunda discussão sobre o ato de descolonizar os saberes, para isso ela transcende a abordagem conceitual e explora diretamente a dimensão formal na performance “Descolonizando o conhecimento” que através de uma dinâmica interdisciplinar aborda o público situando-o psicologicamente dentro de recorrentes operações coloniais subjetivas.
As imagens estão aí por toda parte sendo recuperadas e resignificadas, supostamente a disciplina acadêmica que teria os meios necessários para lidar com essas imagens seria a história da arte. A história da arte enquanto uma ciência da arte, “a única ciência possível da arte”, segundo Giulio Carlo Argan, se estruturou a partir de métodos a fim de sistematizar um produto da subjetividade humana, a obra de arte – em seu sentido mais amplo. Apesar das recentes atualizações e mudanças de enquadramento, o campo ainda se demonstra inacessível quando se trata de alcançar um público não especializado em arte.
Ora, sabemos que é principalmente a esse público a quem devemos dirigir uma proposta de conteúdo descolonial. Em “O fim da história da arte”, um clássico da disciplina, o historiador da arte alemão Hans Belting problematiza o comentário de arte em termos metodológicos como uma forma de argumentação que teoricamente não daria conta das demandas do campo. Apesar disso a crítica tendo também como objeto a obra de arte, foi capaz de operar por outros meios viabilizando ferramentas interpretativas ao público que uma disciplina acadêmica com todo seu rigor cientifico muitas vezes não foi e não é capaz de oferecer.
No intuito de investigar as situações estéticas e conceituais que não operam por termos ocidentais saio aqui em defesa do comentário de arte, não como meio para qualquer conversão intelectual mas para dele valer-me enquanto exercício facilitador de potencias interpretativas fundamentalmente descoloniais. As imagens necessárias se reproduzem e se revelam cada vez mais, o esforço que nos cabe está em projetá-las para o centro da discussão. Desse modo ousamos realocar nossa sensibilidade interpretativa para que elas possam funcionar como um poderoso vetor descolonial e assim repousem em sua essência como produção sensível encarnada de pulsão ancestral.
Ombela Assumpção é pesquisadore afroindígena independente e graduande em História da Arte pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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