Conheci a obra de Maxwell Alexandre no dia do seu batismo na galeria A gentil Carioca em 2018. O batizado, performático e simbólico, também deu o nome à sua exposição individual: ‘O Batismo de Maxwell Alexandre’. Com direito a distribuição de velas e de pagelas devocionais da Igreja do Reino de Arte (criada por Maxwell e amigos), a cerimônia do artista (de família religiosa, porém nunca batizado) pode ser lida com múltiplos sentidos, pois também marca a sua entrada definitiva no circuito da arte.
Maxwell trabalha com pinturas de mediano e grande formato, mas quase não pinta sobre tela: utiliza como suporte elementos cotidianos e acessíveis como lonas de piscinas capri, papel pardo, restos de antenas parabólicas, portas e esquadrias de ferro, etc. Dessa forma, converte materiais inusitados em suporte material e simbólico das suas narrativas. Narrativas que são construídas a partir das suas vivencias no Rio de Janeiro, sobretudo, na favela da Rocinha (onde possui o seu ateliê).
O artista oscila entre a pintura e as ações performáticas: além do batismo, também realiza procissões nas quais carrega as suas telas até o destino expositivo para serem montadas. O momento pré-exposição também marca o ritual e se converte em obra de arte, em oração. Para ele, pinturas são orações e o seu ateliê é o templo.
Ainda em 2018 sua obra Éramos as cinzas, agora somos o fogo (2018), com um tamanho imponente, anunciava a entrada da exposição ‘Histórias Afro-Atlânticas’ (ganhadora do título de melhor exposição do ano), e o artista conquistava uma residência no Delfina Foundation em Londres. 2019 não seria diferente para ele: no dia 7 desse mês, o artista inaugurou a exposição ‘Pardo é Papel’ no Museu de Arte Contemporânea de Lyon na França.
Maxwell afirma que ao pintar corpos negros sobre papel pardo está articulando um “ato político e conceitual” já que “a cor parda foi usada durante muito tempo para velar a negritude.” E ao levar a cabo esse ato intensifica “o diálogo entre a quantidade de papel articulada e o número de corpos pretos em posições contemporâneas de poder”.
Das suas grandes “telas” de papel pardo surgem cenas cotidianas, talvez íntimas, com personagens de rostos apenas esboçados. Convivem caos e repressão, com esperança e luta. Compartilham o mesmo espaço marcas (toddynho, danone, adidas, etc.) com uniformes de escolas públicas, personagens pop e super-heróis. O artista cria um universo cultural e político, que parte das suas experiências cotidianas e pessoais, suficientemente potente para atravessar qualquer que tenha vivido ou transitado o cotidiano marginalizado do Rio de Janeiro. E é nesse ponto em que reside a potência do seu trabalho: no encontro desse universo narrativo com o seu suporte material, que está impregnado de significados e que reforça o caráter crítico da obra. Pergunto-me como o espectador europeu de ‘Pardo é papel’ reage frente a essas imagens e esse universo que lhe é tão alheio.
