Uma das instituições mais fortes e tradicionais do campo artístico é o Salão de Artes. Sua criação remete oficialmente ao século 18 na França, e é ao contexto destes salões que se atribui o surgimento da crítica de arte. O próprio Salão dos Recusados (criado no século 19 e conformado pelas obras recusadas no Salão oficial) foi logo absorvido pelo discurso hegemônico, virando parte da tradição e, portanto, uma instituição em si.
Interessa-me pensar em como o conceito de salão, que pode soar tão tradicional ou até mesmo conservador, continua sendo ressignificado e transformado em um contexto contemporâneo, e ao mesmo tempo caótico, às margens das instituições oficiais. É nesse contexto que quero destacar o 1º Salão Vermelho de Artes Degeneradas, promovido pelo Atelier Sanitário, e pensar-lo como um lugar de resistência, crítica, produção artística e, logicamente, muita balbúrdia.
O Salão aconteceu no último dia do trabalhador (fazendo jus ao seu nome, vermelho, e inscrevendo-se na tão temida doutrina fantasma marxista e gayzista) e teve lugar no próprio Atelier Sanitário, localizado no Rio de Janeiro. O evento buscou “selecionar, avaliar e revelar a nova produção artística esquerdopata, doutrinadora, abortista, gayzista, feminazi no território nacional.” A premiação, fator tradicional e característico dos salões de arte, se transformou em mamata: para o primeiro lugar a mamata foi um mês de residência no Atelier; para o segundo, uma mamadeira de piroca.

Cassia Nunes, com a performance “Aparição”, e Agrippina Manhattan, com o projeto educativo doutrinador “Desenhe-se batendo em um fascista”, empataram no primeiro lugar e ganharam um mês de residência. O segundo lugar foi para Henrique Tarlé, com a obra “Dickland”, que levou a tão sonhada mamadeira de piroca (já esgotada nas escolas do país).
O Salão também organizou o Prêmio PICA online (Prêmio Implora por Curtidas dos Amigos). O artista mais votado conquistou o prêmio com a obra “Só acredito vendo”, uma releitura brasileira, contemporânea e degenerada da obra “A incredulidade de São Tomé” de Caravaggio. Yuri Campagnaro levou pra casa uma mamadeira de piroca e um mês de residência no Atelier: mamata pura (tem que acabar com isso daí).

O Salão Vermelho de Artes Degeneradas acaba revelando uma emergência, visível na apropriação crítica do contexto sócio-político, que é transformada em obra, em performance e em ação. Talvez um dos rasgos mais interessantes do campo artístico contemporâneo e periférico seja a capacidade de transformar Salão de Arte em Balbúrdia (com B maiúscula).
A boa notícia é que a balbúrdia não tem previsão pra parar, talkey? A balbúrdia continua nesse domingo (19 de maio) em que o Salão reabrirá mais uma vez ao público, a partir das 15h no Atelier Sanitário (Rua Pedro Ernesto, 56, Gamboa, Rio de Janeiro, RJ).

Vanessa Tangerini é carioca e suburbana. Ex-aluna do Pedro II e da EBA (UFRJ). Cursa a Licenciatura em Curadoria e Historia da Arte na Universidad del Museo Social Argentino em Buenos Aires, Argentina. Atualmente desenvolve sua pesquisa na área de Curadoria e Educação.
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