helena almeida foi uma artista portuguesa que iniciou sua produção no final da década de sessenta. artista multifacetada, helena agrupa em suas obras práticas artísticas contemporâneas de sua época, onde o corpo é o elemento central de criação de suas imagens.
as fotografias de almeida exploram uma gestualidade corporal. imaginando gestos, corpos e movimentos a artista criou sua linguagem performativa, imortalizando seus movimentos para a câmera e, muita das vezes, intervindo no mesmo com o seu azul, o azul de todos nós, não um azul que muita das vezes é remetido a yves klein. mas ouso dizer que helena tinha suas próprias cores, suas próprias nuances, que ao encontrarem o corpo seu, na imagem final, dançavam junto com ela.
helena almeida fez da pintura um local de insatisfação potencializando assim o seu corpo diante da câmera como forma de criação. sua obra é seu corpo, o seu corpo é sua obra, como diz a grande última exposição da artista. almeida revela-se e oculta-se em suas fotografias, trabalhando com longa exposição, permitindo ter seus movimentos borrados pela máquina, de ter também seu corpo fragmentado, delimitado pelos recortes que cria, tal como se pudesse se desmembrar e expor isoladamente as movimentações de suas pernas, de suas mãos.
em “ouve-me” o corpo da artista faz-se fantasmagoria, semi-escondido por detrás de um papel branco, helena relaciona-se com o mesmo, tensionando-o até o último limite, alterando a forma do mesmo, fazendo com que o seu corpo marque o papel, modificando-o. o que marca a obra de almeida é o uso de seu corpo e de como ele relaciona-se com os espaços e os materiais, assim como é colocado em “ouve-me”.
“seduzir” um dos últimos trabalhos de almeida, desenvolvido de dois mil a dois mil e dois, advém do mesmo gesto criativo de suas séries anteriores – o corpo da artista fotografado em seu atelier, que um dia fora também o atelier de seu pai, o escultor leopoldo almeida, mas nessa série o rosto da artista está sempre posto fora de enquadramento, escondida do público que a observa. com esse gesto a artista não mais de individualiza, ela torna-se um corpo genérico buscando o conforto/desconforto de seu corpo diante da máquina que a captura e a eterniza como um corpo qualquer para um público qualquer.

faço esse debruçar sobre a obra de helena almeida como um gesto; uma tentativa de valorizar o trabalho da artista em solo brasileiro. as criações de almeida foram somente exaltadas em uma grande mostra, chamada de “a minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra”, em dois mil e quinze, e em dois mil e dezoito a artista ganhou um espaço no tate modern, em londres, num espaço focado na relação entre o indivíduo e a obra da arte.
assim, o gesto artístico de helena almeida, que parte do seu corpo, sua movimentação, sua experiência para a câmera eterniza-se em suas imagens, tal qual tentamos, aqui, criar um pequeno espaço de eternidade que ajude a perpetuar, de alguma forma, as obras da artista portuguesa.
Lucas Rodrigues é ator, performer e artista visual. Graduando em Antropologia na UFF e pesquisador da cena contemporânea teatral, no Laboratório de Criação e Investigação da Cena Contemporânea. Coordena o Sem Cabeça Núcleo de Performance, da Companhia Coletivo Sem Órgãos.